Rico em urânio, Brasil investe para produzir combustível nuclear “em casa”

País domina tecnologia, mas depende de estrutura estrangeira para enriquecimento
Para ampliar a oferta de energia elétrica em território nacional e buscar fontes alternativas de geração, o Brasil pretende construir, nas próximas décadas, pelo menos mais cinco centrais nucleares. Com novos reatores entrando em operação, o país terá de aumentar também a oferta de urânio, a matéria-prima que faz funcionar as turbinas das usinas atômicas.

Neste quesito, segundo especialistas ouvidos pelo R7, a situação é confortável. Hoje, o país tem a sétima maior reserva de urânio do mundo. São aproximadamente 309 mil toneladas, e com um detalhe: apenas 25% do território nacional foi mapeado.

O assessor da presidência da INB (Indústrias Nucleares do Brasil), Luiz Filipe da Silva, diz que o potencial do país é ainda muito grande. De acordo com estimativas, é possível que o Brasil tenha, na verdade, a segunda maior reserva de urânio do planeta, atrás apenas da Austrália, onde há quase 1,5 milhão de toneladas.

- A gente imagina que o potencial seja muito maior. Essa foi uma campanha [de prospecção] que fizemos entre 1975 e 1988, e atingiu um terço do que seria a área favorável para encontrar urânio. Ainda há muito trabalho a fazer, e a gente acredita que possa chegar a 1 milhão de toneladas facilmente.

Fica no sul da Bahia, perto da cidade de Caetité, o pólo principal de extração de urânio do país. Ali estão 100 mil toneladas do minério, e a usina construída no local, que retira o material do solo e realiza a primeira etapa do processamento, é suficiente para abastecer Angra 1 e Angra 2. São produzidas, por ano, 400 toneladas de concentrado de urânio.

Segundo Silva, para o futuro, quando Angra 3 estiver concluída e as outras quatro centrais nucleares previstas saírem do papel, será necessário ampliar a capacidade dessa fábrica, o que exigirá recursos da ordem de R$ 100 milhões.

- Estamos com uma expansão prevista para atender Angra 3, e isso praticamente duplicará a capacidade [da usina de Caetité]. Além disso, temos outro projeto de mineração em implantação no Ceará.

No Estado, uma nova unidade está sendo erguida para aproveitar a jazida de Itataia, próxima do município de Santa Quitéria. Além disso, há indícios de que outras reservas podem ainda ser encontradas em áreas do sul do Pará e do Amazonas. 

Para se ter uma ideia do potencial das reservas brasileiras, segundo o assessor da INB, apenas com as unidades instaladas na Bahia e no Ceará o país já teria condições de abastecer todo o seu programa nuclear pelas próximas décadas - o que significa manter em funcionamento até sete centrais.

Ciclo

Para que se transforme na energia que é gerada dentro de um reator nuclear, o urânio tirado da natureza passa por um complexo processo, composto de sete etapas. Destas, duas - a conversão e o enriquecimento - ocorrem no exterior, embora o Brasil já tenha desenvolvido a tecnologia necessária para fazê-las aqui mesmo.

A segunda fase do ciclo, chamada conversão, é feita por uma empresa francesa. Neste momento, o urânio purificado e concentrado, sob a forma de um sal amarelo chamado yellowcake, é transformado em um gás.

O estágio seguinte é o enriquecimento, quando a substância é submetida a um procedimento que altera sua composição e amplia o potencial como combustível gerador de energia elétrica.

O enriquecimento, ponto-chave no processamento do urânio, é operado por um consórcio inglês-alemão-holandês. O urânio enriquecido é devolvido ao Brasil em contêineres e encaminhado para a reconversão, quando o gás retorna ao estado sólido, sob a forma de um pó.

O pó é usado, então, para produzir pastilhas, que são posteriormente enviadas para as centrais nucleares. Duas pastilhas geram energia suficiente para abastecer, por um mês, uma casa em que vive uma família de quatro pessoas.

O presidente da Aben (Associação Brasileira de Energia Nuclear), Edson Kuramoto, afirma que o Brasil está a um passo de conquistar a auto-suficiência na geração nuclear. Segundo ele, isso pode ser feito com um investimento considerado relativamente baixo, sobretudo se comparado a outros projetos de infraestrutura incluídos no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

- Não precisaríamos ter um convênio com outros países, porque detemos a tecnologia dessas duas fases. Simplesmente é necessário um investimento da ordem de R$ 3 bilhões, o que é muito pouco se formos considerar outros investimentos que estão no PAC. Só na reforma do Maracanã vão gastar R$ 1 bilhão.

De acordo com Luiz Filipe da Silva, a maior parcela do investimento previsto se refere à etapa do enriquecimento: são R$ 800 milhões. Uma nova unidade funcionará em Resende (RJ), e a expectativa é concluir o projeto até 2016 ou 2017. Hoje, no mundo, apenas seis organizações enriquecem o urânio comercialmente.

O supervisor de novos empreendimentos da Eletronuclear, Drauzio Atalla, afirma que, com o domínio do enriquecimento, além de suprir a demanda interna, o Brasil poderia inclusive pensar na exportação do excedente de urânio combustível.

- Somos um dos poucos países que reúnem uma vasta reserva nuclear, tecnologia de enriquecimento e maturidade razoável na indústria.
Fonte:r7.com